Tal como um filme de Hollywood, Steve Jobs literalmente cumpria a sua jornada.
O SURGIMENTO DA LENDA STEVE JOBS – PARTE 01
A QUEDA DE STEVE JOBS – PARTE 02
STEVE JOBS SEM A APPLE – A APPLE SEM STEVE JOBS – PARTE 03
Após criar a Apple, torna-la uma das empresas mais relevantes do mundo, e ser afastado do dia a dia da própria empresa; Jobs enfrentou uma jornada árdua em que colocou sua própria reputação e fortuna em jogo, e que lhe deu valiosas lições sobre como comandar uma empresa e ser um verdadeiro líder, ainda que extremamente controverso.
De volta à Apple como CEO interino, Jobs teria que literalmente correr contra o tempo para salvar a empresa.
O cenário era caótico.
Os produtos não eram mais atrativos e estavam obsoletos. O caixa da empresa estava amplamente desfalcado. A equipe não era suficientemente boa.
E para completar, havia um consenso na opinião pública de que a Apple estava fadada a falência em apenas alguns meses.
O pessimismo era geral, e por conta disso, a Apple tinha dificuldades de encontrar bons profissionais, ou até mesmo um executivo de alto gabarito que topasse o desafio.
Nesse cenário, Jobs seria muito mais do que um interino; ele também precisaria ser o fiador de um projeto ousado que tentava desarmar uma bomba relógio. E de uma forma ou de outra, o jeito Steve Jobs era exatamente o que a Apple precisava naquele momento.
Nos anos anteriores, a Apple tentou uma série de experiências, e mesmo tentando se encaixar em todos os segmentos, acabou não se destacando em nenhum.
E enquanto o seu caixa sangrava, o mantra literalmente era: menos é mais. E Jobs era o porta-voz ideal para essa filosofia.
Para apagar o incêndio, Steve deveria agir rápido. Além dos produtos pouco atrativos, era necessário enxugar a máquina para que o pouco capital remanescente fosse usado para o desenvolvimento de novos produtos.
Porém, para operar as mudanças necessárias, Jobs precisaria de apoio de cima para baixo. E se em 1985, o conselho era seu inimigo, naquele momento ele precisava se cercar de aliados. E essa foi sua primeira exigência.
Sem saída, os membros antigos entenderam por bem dar a liberdade para que Jobs trouxesse novos membros para a direção da Apple. Desse modo, ele trouxe figuras de expressão de diferentes mercados, e se cercou de personalidades como o magnata da Oracle, Larry Ellison, seu melhor amigo.
O intuito era que todos os membros entendessem profundamente os pilares da empresa. Criatividade, Inovação, Simplicidade e Liberdade; principalmente para Jobs.
O QUE STEVE JOBS PENSA QUE AS PESSOAS INTELIGENTES TÊM EM COMUM
Os valores eram tão fortes, que o próprio Jobs chegou a convidar e desconvidar alguns possíveis membros, pelo simples fato de que eles queriam que as decisões fossem tomadas de forma colegiada e democrática.
Como o tempo era o maior inimigo daquele momento, Jobs ganhou a oportunidade de operar praticamente tudo o que queria.
UMA PARCERIA POLÊMICA
E assim, ele reassumiu o papel de protagonista da empresa, ao anunciar ao mundo a sua volta durante a Mac World de 1997, tradicional feira de computadores da Apple.
Na oportunidade, Steve comunicou ao mundo novamente os valores da empresa. De forma proposital, ele enfatizava o uso do ‘’Nós’’ durante o discurso, demonstrando que a Apple voltaria a reconhecer a importância de seus consumidores, que eram verdadeiros fãs da marca.
Porém, naquela mesma apresentação, o visionário fez um anúncio que caiu como uma bomba em todo o mundo, e principalmente junto aos fãs da empresa.
Naquela oportunidade, foi anunciada uma parceria entre a Apple e a Microsoft. As duas empresas rivais estariam unidas por um acordo que duraria cinco anos, e que possibilitaria que a Apple utilizasse alguns dos recursos do pacote Office em seu sistema operacional.
O anúncio era tido como inacreditável.
Além da sabida relação tumultuada entre as duas companhias, a Apple movia uma série de processos contra a Microsoft por quebra de acordos e infração de patentes. E por conta desse ambiente, os presentes chegaram a entoar vaias durante o anúncio.
Porém, o clima ficou mais ameno quando Jobs anunciou que a Microsoft também faria um investimento de 150 milhões de dólares, com a compra de ações sem direito a voto.
Naquele momento, até o fã mais fervoroso sabia que a situação da Apple era delicada, e que a o investimento poderia significar literalmente a sobrevivência da empresa.
Ainda assim, o mais chocante daquela noite foi o momento em que Steve Jobs disse para o público que ali haveria uma ligação de vídeo para um grande parceiro da Apple: Bill Gates.
Dessa forma, Gates apareceu em um telão para toda a plateia, dizendo o quanto apreciava a Apple e o trabalho que haviam feito em conjunto na década de 80.
A aparição lembrava e muito o comercial 1984. Dessa vez, o Big Brother não era a IBM, e sim Bill Gates, que aparecia com seu rosto enorme, acima de Steve Jobs no palco.
Contudo, naquele momento, não havia uma esportista para arremessar um martelo para destruir o telão. E houve reclamações enquanto Gates discursava, sem parecer notar o ocorrido.
Anos depois, Jobs assumiria a seu biógrafo oficial que a forma como a apresentação se desenrolou com Gates foi uma péssima ideia. Especialmente pelo telão.
O anúncio repercutiu mal entre os entusiastas, mas muito bem para o mercado em geral.
Antes daquele dia, Jobs pessoalmente arranjou o acordo com Gates, após um telefonema.
Naquela época a Microsoft enfrentava o início de um processo antitruste movido pelo Governo dos Estados Unidos, já que ela concentrava quase que todo o mercado de sistemas operacionais do mundo.
Ao mesmo tempo, os processos movidos pela Apple eram causas ganhas; já que de fato, a Microsoft havia quebrado vários acordos feitos anteriormente. Segundo o próprio Jobs, o valor das indenizações seria superior a 1 bilhão de dólares.
Porém, a Apple poderia estar falida no final do processo, e a Microsoft poderia ter problemas com a justiça. Então, Jobs propôs uma trégua, que renderia compartilhamento de tecnologia e o investimento financeiro por parte da empresa de Gates, e em troca, traria paz judicial para a Microsoft em duas frentes diferentes.
Desenrolado o acordo, o mercado recebeu muito bem a notícia da trégua entre os gigantes, e as ações da Apple subiram 30%; o que representava uma capitalização de mais de 800 milhões de dólares para dar fôlego à Maçã.
Ainda assim, o dinheiro poderia aliviar, mas não resolvia os problemas da companhia, que ainda tinha um longo caminho pela frente.
De pronto, o primeiro passo seria mostrar ao mundo não apenas que ele estava de volta, e sim, que a Apple, a verdadeira Apple, havia voltado.
PENSE DIFERENTE
Para isso, Jobs recrutou um antigo parceiro, o publicitário Lee Clow; que foi um dos responsáveis pela concepção do comercial 1984 e era considerado um dos melhores profissionais do mercado. Clow trabalhou com a Apple durante os primeiros anos, e teve uma relação com a empresa até o início dos anos 90; mas foi deixado de lado por Sculley que preferiu outras empresas.
Clow e seus parceiros, atendiam aos requisitos de Jobs, que os respeitava e os colocava no patamar mais alto, daqueles que realmente podem fazer algo relevante pelo mundo.
E novamente alinhados, Jobs e Clow trabalharam em uma campanha publicitária que mostrava ao mundo os valores da Apple e como seus produtos eram criados para um certo tipo de pessoa.
A campanha recebeu o nome de ‘’Pense Diferente’’, e passou a ser o slogan da marca por alguns anos. Em resumo, a campanha mostrava fotos de grandes personalidades da história, que também eram de certo modo, alguns dos heróis pessoais de Jobs.
Dentre eles: Gandhi, Bobby Kennedy, Martin Luther King, John Lennon. Músicos, ativistas, políticos, inventores. Todos aqueles que ousaram pensar diferente.
Além das fotos, foi criado um comercial que incluía a narração de um texto que simbolizava os valores da marca. O texto quase foi narrado pelo próprio Steve, a partir de uma ideia de evidenciar o seu retorno. Porém, a versão final ficou com a narração do ator Richard Dreyfuss.
A ação ganhou algumas versões, e a mais curta dizia:
‘’Isto é para os loucos. Os rebeldes. Os criadores de caso. Os que veem as coisas de forma diferente. Enquanto alguns os veem como loucos, nós vemos gênios. Porque as pessoas que são loucos o suficiente para achar que podem mudar o mundo, são as que de fato, mudam.’’
A ação reforçava os valores e o posicionamento da Apple. E promovia o início da empresa não como uma fabricante de eletrônicos, mas sim como uma empresa que fabrica produtos que compõem um estilo de vida.
Publicada ainda em 97, a ação foi um sucesso estrondoso, e mostrava para o mundo que a verdadeira Apple estava de volta.
Mas, a empresa ainda tinha problemas com o seu veículo principal: os produtos.
UMA REFORMULAÇÃO COMPLETA
Naquele momento, a Apple fabricava não apenas computadores, mas também impressoras, monitores e outros dispositivos. Porém, nenhum deles de fato trazia um grande diferencial em relação aos concorrentes.
Alguns, inclusive, eram muito piores do que os demais. E, segundo Jobs, os produtos da Apple não eram mais ‘’Sexys’’, tal como até a sua saída.
De fato, os produtos não tinham diferenciais e a marca caía no esquecimento. Dessa forma, Jobs tomou uma decisão audaciosa e direta ao ponto.
Primeiro ele traçou um diagrama com quatro quadrantes. Divididos entre Computadores de Mesa, os Desktops; Laptops; uso profissional e uso comum.
A partir do esquema firmou-se a decisão. A partir dali a Apple eliminaria todos os seus produtos, e focaria apenas em 4 itens.
Desktops e Laptops para uso comum e profissional.
A palavra da vez era Foco. E foco, era literalmente se concentrar em apenas 4 itens, e dizer não para todos os outros.
A Apple não era formidável em nenhum dos outros ramos, e naquele momento, ela não podia se dar ao luxo de tentar algo que não fosse aquilo que sabia fazer de melhor: Computadores.
A decisão também incluía o fim do Newton, a menina dos olhos de John Sculley; que tinha vendas razoáveis, mas segundo Jobs, demandava um esforço maior do que o resultado proporcional.
Outro setor afetado eram as parcerias que a Apple havia feito para licenciar o seu sistema operacional para outros fabricantes menores de computadores.
A ideia inicial criada em 93 era que outras empresas pudessem ter a licença do OS, tal como a Microsoft fazia com o Windows. Porém, na prática, isso significava que o consumidor podia comprar outros computadores mais baratos e também equipados com o sistema operacional Apple, ao invés de ter que comprar os computadores da própria marca que eram 500 dólares mais caros. O que gerou uma canibalização entre os produtos da própria Apple, já que a licença impactava as vendas dos computadores da marca.
Além da descontinuação dos produtos, a nova política resultaria também em um massivo corte de custos, que passava também pela demissão de milhares de empregados e a dispensa de diversos fornecedores.
Na mesma linha, o espírito elitista de Jobs fez também com que vários membros fossem dispensados por não terem as qualidades necessárias para a criação de projetos revolucionários, capazes de salvar a Apple.
O GÊNIO DO DESIGN
Nesse contexto, Jobs não apenas recrutou novos talentos, como também conseguiu encontrar dentro da própria empresa, alguns valores que estavam preteridos na hierarquia da empresa. Dentre eles, o designer Jonathan Ive.
Ive é um designer inglês que já estava na empresa desde 1996 e que acumulava um histórico de sucessos e destaque em outras empresas. Apesar disso, na Apple, ele não estava sendo valorizado e tinha pouco espaço para apresentar os seus conceitos e suas habilidades; e por conta disso, ele pensava em deixar a companhia, quando Jobs voltou.
Estimulado, Ive permaneceu na empresa e logo chamou a Atenção de Jobs. Assim como o chefe, ele também tinha conceitos e visões parecidas, como a apreço à simplicidade e o apego aos detalhes. E em pouco tempo, ele se tornou um dos membros mais próximos de Jobs, e passou a ser considerado como o cabeça do design da Apple desde então.
Com o auxílio de Ive, Jobs passou a capitanear o projeto de um computador que seria lançado com a missão de ser o produto salvador da empresa. Um computador de mesa que seria o primeiro dos quatro produtos foco, e que representaria a maior parte das vendas.
E tal como o lançamento do Macintosh, o novo computador deveria ser capaz de criar um enorme barulho e para isso, ele deveria ser como seu antecessor, diferente, inusitado e inovador.
Enquanto na época os computadores pessoais eram praticamente todos iguais, com monitor, gabinete, teclado, mouse e todos os componentes da mesma cor, sem vida ou brilho; o novo produto da Apple deveria ser visualmente impactante e capaz de demonstrar desde o primeiro olhar que ele era realmente diferente.
O NOVO COMPUTADOR DA APPLE
Sob esse mantra, cada detalhe da nova máquina deveria ter o mesmo apelo, sem deixar de lado a qualidade e a beleza.
E assim, tal como o antigo Mac, a nova máquina seria um all-in-one. Gabinete e monitor estariam juntos na mesma peça; que por sua vez teria uma capa translúcida, que seria possível ver os componentes internos da máquina.
Se antes Jobs tinha a fixação pela organização interna das máquinas, dessa vez, era também possível ver o cuidado em cada detalhe através da proteção.
Além disso, a peça contaria com uma porta retrátil, e uma espécie de alça, que fazia com que ele pudesse ser retirado da embalagem original tal como uma bola. Ele também não teria disquete e ganharia um mouse em formato de disco de hockey. O objetivo era criar um computador para o futuro.
Mesmo que na ocasião o disquete ainda estivesse em grande uso, Jobs era inflexível no sentido de que não colocaria uma tecnologia que estava em vias de desaparecer. E ele teve razão em pouco tempo.
Para tornar o visual ainda mais agressivo, a parte translúcida ganhou uma coloração especial batizada de Azul Bondi, em homenagem à praia Australiana. A cor era extremamente específica, e durante a criação do tom, Jobs e Ive chegaram a visitar uma fábrica de jujubas para tentar criar algo que mexesse com o imaginário das pessoas.
Para completar, a máquina seguia a filosofia de Jobs de desenvolvimento de ponta a ponta, com a integração de software e hardware, todos desenvolvidos pela própria Apple. Assim, a nova máquina não tinha paralelos ou similares.
Por fim, o novo computador foi equipado para tornar fácil e prática a conexão à internet, então realizada através de fios diretamente plugados na CPU.
E a funcionalidade, mais tarde, estaria presente no nome da nova máquina. Internet Macintosh ou simples iMac.
Com esses predicados, o desenvolvimento do novo computador não foi menos tumultuado do que o das demais máquinas da época de Jobs. O próprio tinha momentos de altos e baixos, e transitava entre uma liderança carismática e uma brutalidade sem igual, chocando e encantando seus colaboradores na mesma proporção.
Ainda assim, o iMac foi apresentado em Agosto de 1998 com o preço de 1299 dólares. Tal como de praxe, a apresentação foi feita pelo próprio Jobs, com um show de luzes que elevava o computador ao status de uma joia.
Diferente de tudo aquilo que o mercado oferecia na ocasião, o iMac foi um sucesso e em pouco tempo se tornou uma febre, principalmente no mercado americano e entre os jovens.
O sucesso foi tão grande que também foram lançados outros quatro modelos, com 4 cores diferentes e exclusivas.
Ali estava o produto que simbolizava a volta da Apple. Simples, único e inovador.
Depois de 13 anos, Steve Jobs chamava a atenção do mercado novamente, e menos de um ano depois, ele foi oficializado como novo CEO da Apple. Até então, ele recebia apenas 1 dólar como salário mensal, e não tinha a possibilidade de receber uma bonificação através de ações.
Depois de dar a volta por cima, Jobs alcançou um novo status, mas ele tinha outros problemas gigantes pela frente.
Além de enfrentar os problemas da Apple que ainda existiam, ele tinha novos desafios e passaria por uma crise que quase acabou com o mercado de tecnologia…
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